terça-feira, 24 de março de 2015

Museus | Utilização de marketing em museus

Apesar da mudança de mentalidade em Portugal em relação à velha questão: "a cultura dá dinheiro?" ainda se discute bastante este tema e creio que ainda há uma série de preconceitos sobretudo em relação aos museus.
Ainda existe uma opinião pública pouco informada que não entende a utilização de estratégias de marketing em museus e ainda muita gente pensa que os museus são um buraco financeiro! Não podia ser uma ideia mais errada... mas atenção não é pelos museus serem fonte de receitas que vão deixar de ser instituições sem fins lucrativos como consta na definição de museu do ICOM:

“os museus são instituições permanentes, sem fins lucrativos, ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, abertas ao público, que adquirem, preservam, pesquisam, comunicam e expõem, para fins de estudo, educação e lazer, os testemunhos materiais e imateriais dos povos e seus ambientes”.

Penso que ainda há muita gente que está equivocada com os conceitos vamos então analisar a definição de instituições sem fins lucrativos:

"As organizações sem fins lucrativos são organizações de natureza jurídica sem fins de acumulação de capital para o lucro dos seus diretores. Todo seu lucro deve ser reinvestido em estrutura ou outras áreas da pessoa jurídica."

Ou seja as instituições sem fins lucrativos podem e devem gerar lucro (!) admirados? Agora esse lucro deve ser reinvestido afim de melhorar os serviços do museu para que este possa cumprir da melhor forma a missão a que se propõe. Não vamos agora pensar no museu como uma empresa ou um estabelecimento comercial onde o lucro gerado serve apenas para encher os bolsos de alguns. Certo? Existem casos destes e apesar de utilizarem a palavra museu como nome do "estabelecimento" lamento informar mas não são museus.

Vamos voltar ao tema principal, a utilização de estratégias de marketing em museus. 
Actualmente, um crescente número de museus está a optar por reinventar-se, adaptando-se às expectativas e condições de mudança da sociedade contemporânea, respondendo com novas formas de organização, design de exposições, programação e serviços. É fundamental criar programas e serviços que convertam a visita ao museu numa experiência agradável e gratificante para quem o visita e a programação estratégica de marketing permite que os museus modelem, planifiquem e implementem os seus objetivos, ofertas e os públicos a que pretendem chegar.
Pretende-se, então que, através das aplicações práticas do marketing, os museus cheguem a um público diversificado e que, desta forma, resolvam os problemas de sustentabilidade.
Nos últimos anos os museus para proteger a sua missão e a sua independência têm-se deparado com pressões crescentes para que adotem uma maior orientação para os visitantes, tenham mais em conta os interesses e necessidades dos públicos e respondam à procura do mercado em geral. A promoção dos museus através de estratégias de marketing é uma realidade relativamente recente, pois, anteriormente os museus ofereciam programas limitados direcionados para um público especializado e as suas despesas eram suportadas, sobretudo, por mecenas.
Em Portugal, o ponto de viragem para a aceitação e mudança de mentalidade em relação à aplicação do marketing foi em 1994, com a Lisboa Capital Europeia da Cultura. Foi a primeira vez que se falou diretamente de marketing cultural no nosso país. Anteriormente, considerava-se que a aplicação do marketing iria perverter os objetivos pedagógicos da cultura pois de uma forma conceptual, um tanto ou quanto redutora, o marketing tem como finalidade vender um produto, impor ao consumidor necessidades de consumo.
Mas em marketing cultural não é isso que se pretende, não deve ser impositivo mas aproximar e seduzir as pessoas para a cultura, deve ter neste contexto um importante papel informativo e pedagógico. Os públicos não devem sentir que ir ao museu ou participar em actividades culturais devem ser uma imposição social deve haver, sim, uma democratização do acesso à cultura. Neste sentido, necessitam adotar estratégias de comunicação e oferecer um maior e mais diversificado número de programas, que atraiam os variados públicos, a fim de se tornarem uma referência cultural de qualidade. Para isso, a sustentabilidade da instituição é fulcral sendo necessário um razoável suporte financeiro que lhes permita alargar os públicos.
O marketing em museus deve estar presente na comunicação entre o público e a instituição, pois é através das ferramentas que dispõe que identifica os públicos-alvo, entendendo-se estes, não só como os visitantes que já frequentaram o museu mas também os potenciais visitantes; melhora os seus produtos e serviços oferecidos e é capaz de criar medidas destinadas a assegurar uma melhor assistência e a aumentar o número de entradas. Mas as estratégias de marketing não visam apenas aumentar o número de visitantes, mas também as quantias por estes, dispendidas nos serviços que o museu lhes coloca ao dispor e até captar apoios de pessoas e entidades (fundraising).
Contudo, a escolha dos meios de comunicação, programas e acções a desenvolver para atingir a visibilidade e a distinção de um museu deve ser ponderada, dependendo dos objectivos específicos do museu, do tipo de público que pretende atingir e dos custos a suportar.
Inicialmente, foram várias as reações negativas da utilização do marketing na gestão dos museus, acusando-os de se estarem a tornar espaços comerciais e a utilizar a cultura como um simples negócio lucrativo. Hoje em dia, parece mais consensual que é necessário, os museus adaptarem-se às exigências da sociedade contemporânea para sobreviverem, pois caso não tentem conquistar público terão grande concorrência por parte de outras atividades culturais e de lazer.
Os objetivos atribuídos aos museus no que toca à educação dos seus públicos, contribuindo para o desenvolvimento da sociedade, parecem opor-se à obtenção de lucros resultantes da aplicação das estratégias. Como se poderá então compatibilizar estas duas vertentes, ou seja, assegurar a vocação educativa do museu e simultaneamente possibilitar a angariação de verbas extraordinárias, que, exactamente,
lhe permitam melhorar essa vocação?
Esta é uma questão nem sempre pacífica de responder e deverá ser cada museu, cada um com as suas especificidades, a responder a este desafio, tendo sempre em conta que a cultura não é um bem que se deva tornar vendível, e que deve estar acessível à sociedade em geral, pois o objetivo não é apenas oferecer ao público o que ele deseja, mas também, cativá-lo e sensibilizá-lo para a cultura e educação.
O Museu do Louvre é um exemplo da crescente comercialização dos museus nas últimas décadas. Está hoje de tal forma identificado como uma brand (marca), que emprestará o seu nome a um museu a inaugurar em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, por uma quantia assinalável. Temos outros exemplos de museus que já possuem uma forte imagem de marca como é o caso do Tate Modern, em Londres, do MoMA, em Nova Iorque ou do Guggenheim, em Bilbau.
Publicidade de uma exposição do MoMA no metro de Nova Iorque
Estes museus conquistaram uma grande importância na construção da imagem turística destas cidades contribuindo para o seu desenvolvimento económico, potenciando o comércio e a empregabilidade na sua área envolvente.
Reconhece-se, agora, a importância de criação de imagem de marca, da comunicação e promoção. E é neste sentido, que os museus recorrem a campanhas de publicidade, relações públicas e promoção com o objectivo de reforçar a sua visibilidade, comunicar o seu carácter singular e pedir o apoio do público.
Se por um lado, o marketing pode, de facto, constituir um valioso contributo para a imagem positiva do museu, por outro, como entidades sem fins lucrativos, os museus, não poderão sobrepor as estratégias de marketing com o objectivo claro de aumentar os seus recursos financeiros ao papel educativo que aos mesmos compete.

Utilização de marketing em museus. Sim. Gerar lucros. Sim. Desde que o museu não desvirtue a sua missão, visão e vocação.

domingo, 22 de março de 2015

Museus | Museu do Fado, um caso de adaptação de um edifício industrial

Fachada principal do Museu do Fado
Foto: Ana Simões (2011)
     O edifício que acolhe hoje o Museu do Fado em Lisboa é um excelente exemplo de adaptação de um edifício pré-existente que foi projetado inicialmente para ter uma função industrial, demonstrado a possibilidade de associar património industrial a iniciativas museológicas não ligadas a esta área. São também exemplo disso a Tate Modern Gallery em Londres, o Museu do Oriente em Lisboa ou o núcleo museológico do Museu da Escultura de Roma instalado numa central eléctrica desactivada.
  Nestes projetos, um dos principais desafios é a sua adaptação não comprometer os pressupostos funcionais e estéticos que um museu deve ter. As edificações foram projetadas como unidades industriais sendo que na sua adaptação a instituição museológica terá de ter em conta tanto a preservação do edifício pré-existente como a sua adaptação às funções museológicas.

Vamos conhecer um pouco da história do edifício do Museu do Fado...

       Alçado principal da Estação da Praia (1868)           
 
Fonte: Arquivo Histórico da Epal                            
    Projectado pelo engenheiro Joaquim Nunes de Aguiar a 29 de Fevereiro de 1868, o edifício do Recinto da Praia foi a primeira estação elevatória de águas de Lisboa construída entre 1868 e 1869. O edifício é assim  designado em memória da praia ali existente onde os navios vinham fazer a aguada, a partir do chafariz.
    Erguido em frente ao Chafariz de Dentro, em Alfama, apresenta uma arquitectura industrial de carácter funcional característica de meados do século XIX, sendo uma das obras mais avançadas que a Companhia das Águas de Lisboa realizou nesta época. Um dos objetivos da sua construção consistia no aproveitamento de águas inutilizadas resultantes das nascentes orientais da cidade, de modo a garantir a sua distribuição. 
   Com a construção da Estação Elevatória dos Barbadinhos (hoje Museu da Água) em 1880, a estação passou a funcionar como sistema de apoio de reserva e complemento à acção da estação dos Barbadinhos, em caso de avaria. Foi definitivamente desativada em 13 de Julho de 1938, sendo que até à década de 1960 funcionou como Oficina de reparação de contadores e refeitório, e entre 1974 e 1990 ainda funcionou como Centro de Trabalho do Partido Comunista Português.

    Era objectivo da Câmara Municipal, desde o início da década de 1990, tornar o edifício de novo útil mas sem perder a sua carga histórica. Era urgente recuperar um significativo espaço público da cidade, o Largo do Chafariz de Dentro, em conjugação com a reutilização deste antigo imóvel industrial. Várias hipóteses foram consideradas, incluindo ser um quarto núcleo do Museu da Água e neste contexto procedeu-se à proposta classificação do imóvel, sendo classificado em 30 de Setembro 1997 como imóvel de interesse municipal, sob despacho do ministro da Cultura.
      A estação foi então totalmente reconstruída em Setembro de 1998 como Museu do Fado. Iniciativa da Direção Municipal da Reabilitação Urbana, conjuntamente com a EBAHL (Empresa de Equipamentos dos Bairros Históricos de Lisboa) e projetada pelos arquitetos José Daniel Santa-Rita e João Santa-Rita. 
      A intervenção arquitectónica teve, assim, como objectivo recuperar este edifício industrial e dotá-lo de condições adequadas a um novo uso museológico. A obra realizada conservou, quase na totalidade, a imagem exterior do edifício, reforçando-a pelo contraste com os novos corpos anexos de expressão actual e diferenciados, reconhecendo, desse modo, os seus diferentes contextos, que comunicam bem entre si.
    A localização do Museu do Fado neste edifício em pleno centro histórico de Lisboa, num bairro emblemático considerado berço desta canção popular, é de primordial importância no diálogo que o museu estabelece com a cidade. O museu assume-se como uma porta de entrada para o visitante conhecer melhor o bairro de Alfama e toda a zona histórica envolvente, muito caracterizada pela presença de Casas de Fado, onde este património imaterial e intangível está em constante recriação, num imenso “museu sem paredes” reconstruído no imaginário de cada um de nós. 

Ou seja um "casamento" perfeito...


Ponte rolante no auditório do Museu do Fado
Foto: Ana Simões (2011)





sexta-feira, 20 de março de 2015

Museu Imaginário

              Museu imaginário é um conceito criado por André Malraux (1901-1976) em 1947. Escritor francês, crítico de arte e político activista, André Malraux usou as suas obras para expressar o existentialismo.
             Neste seu ensaio reflete sobre o papel do museu na nossa relação com as obras de arte.
              O aparecimento dos museus, há menos de dois séculos, impôs ao espectador uma relação totalmente nova com as obras de arte, pois tornou-as mais acessíveis à sociedade.
“Até ao século XIX, todas as obras de arte eram a imagem de algo que existia ou não existia, antes de serem obras de arte”, André Malraux quer dizer com esta ideia que o museu transformou peças que tinham anteriormente a sua função particular para que foram criadas, em obras de arte para serem apreciadas pelo espetador devido ao seu valor simbólico. Neste contexto faz todo sentido dizer que “o Museu é um conjunto de metamorfoses.” O museu torna-se um lugar de recontextualização dos objectos pois reune peças que estão descontextualizadas, das quais se retiram a sua função original e atribui-se a função de contar histórias com outros objetos igualmente descontextualizados, onde as narrativas de relacionam.
Deste modo um museu tem uma função e um papel social importante de salvaguarda das obras de arte mas também de transmissão de conhecimento e educação pois proporcionam-nos lugares de estudo e de reflexão. 
O «Museu Imaginário» é um museu formado por reproduções de imagens, é o que cada pessoa conhece de imagens de obras de arte. A sociedade atual tem uma facilidade de acesso ao conhecimento da arte e cultura nunca antes tida por civilizações anteriores, e este museu imaginário, de cada um de nós, pode conter tudo aquilo que nem os grandes museus podem adquirir, desta forma seria possível cada um criar o seu museu ideal. É um espaço imaginário sem fronteiras que nos habita e está em constante crescimento e transformação. Este lugar mental é capaz de criar uma rede de linguagens e de evidenciar as potencialidades das obras sendo possível fazer comparações entre obras de arte, pois dispomos de reproduções de mais obras do que um museu tradicional, as quais são capazes de colmatar lacunas da memória e aprofundar ao máximo o confronto entre as obras.
André Malraux dá-nos vários exemplos de museus imaginários, como a Olimpia de Manet e Uma Olimpia Moderna de Cézanne, os retratos burgueses de Ingres e Daumier, as Vénus de Ticiano e Cabanel, entre outros. O museu imaginário pretende despertar a crítica das obras e é possível transformar uma obra reproduzindo-a de outra forma consoante a visão do artista, foi o que de certa forma fez Picasso em Las Meninas em relação às Las Meninas de Velásquez.
As obras revelam sobretudo uma relação com obras anteriores que metamorfoseiam em outras obras. O museu imaginário abole as limitações da cronologia e reúne a obra de arte por uma sincronia. Essa sincronia faz com que as obras não parem de se modificar, desencadeando uma potencialização das obras através da crítica.
A existência do Museu Imaginário deve-se sobretudo à massiva reprodução de imagens de obras de arte através da fotografia que, tornou possível a comparação de obras de arte mesmo desfasadas no tempo e de artistas diferentes, contribuindo para modificar o diálogo e a hierarquia entre as obras. A fotografia permite perceber pormenores das obras que talvez ao vê-la a olho nu não dávamos conta, no entanto, como nos refere André Malraux, nas reproduções as obras perdem a escala original e uma reprodução não é uma obra de arte nem a substitui.

quarta-feira, 11 de março de 2015

Museus | Redes Sociais

Atualmente, um crescente número de museus está a optar por reinventar-se, adaptando-se às expetativas e condições de mudança da sociedade contemporânea. Neste contexto, as redes sociais são uma ferramenta de comunicação cada vez mais utilizada pelos museus. 
Os museus que, outrora, davam total prioridade às suas coleções ou à sua investigação estão a colocar, agora, os visitantes no centro das suas atividades ao estabelecer relações com as suas comunidades, disponibilizar recursos para atrair públicos mais numerosos e diversos e aplicar novos conceitos e métodos para contribuir para que as ofertas dos museus sejam satisfatórias e educativas para os visitantes.
Os museus oferecem atividades e experiências únicas e singulares e os profissionais devem aumentar a visibilidade e os atrativos das suas ofertas a fim de competir com outras atividades de lazer e captar públicos mais vastos e numerosos. É desta forma, que o marketing em museus deve estar presente na comunicação entre o público e a instituição.
As novas tecnologias devem ser uma importante ferramenta ao serviço da comunicação do museu. A internet veio facilitar a divulgação através do correio eletrónico, website, loja online, newsletters digitais que chegam ao e-mail dos subscritores e das redes sociais.
Todavia, a utilização das redes sociais pelos museus, deve refletir os objetivos definidos pela instituição, por forma que a sua utilização ajude a cumprir a missão a que e propõe.
São diversos os modos encontrados pelos museus para utilizar as redes sociais disponíveis. Procuram promover as suas atividades e coleções, promovem a interatividade com o público através de questões, debates e participação em iniciativas e ainda promovem a divulgação de conteúdos dos seus visitantes.
Para isso, o museu deve perceber a especificidade de cada uma das redes que tem à sua disposição, conhecer o seu funcionamento, o objetivo para que são criadas e conhecer as motivações de quem as usa, definindo desta forma uma estratégia de utilização inserida na sua política de comunicação. É necessário perceber qual é exatamente o contributo das redes sociais para que o museu possa cumprir o que está definido na sua missão e quais os recursos necessários para corresponder às expetativas que se criam a partir do momento que se utilizam as redes sociais.
O crescente uso das redes sociais pelos museus não é apenas uma nova tendência. De facto, as novas tecnologias aumentam as possibilidades dos museus comunicarem. Porém, esta atualização deve ocorrer de forma equilibrada, sem o abandono dos meios de comunicação tradicionais.
As redes sociais podem tornar-se instrumentos viáveis para a implementação de políticas de comunicação. Soma-se a todas as potencialidades uma vantagem... a gratuitidade. A criação de espaços gratuitos é uma oportunidade que os museus não devem descartar. Permitem que os museus possam colocar de maneira livre e rápida a informação sobre as atividades e experiências na internet com poucos recursos, humanos e financeiros. Sendo que, permitem também uma maior proximidade com os seus públicos tornando a relação com os seus visitantes mais humana.
É ainda uma experiência com pouca maturidade em Portugal, contudo existe uma tendência crescente para a tomada de consciência da sua importância para os museus, havendo cada vez mais exemplos de boas práticas.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Museus | Arqueologia e Museologia Industrial

A arqueologia industrial desenvolveu-se em Portugal, sobretudo a partir de 1977/78, não como fenómeno universitário mas ligada às questões de salvaguarda e proteção do património cultural, com a realização da primeira exposição de arqueologia industrial em Tomar, em 1978.
A sua expansão realizou-se durante a década de 1980 a partir da constituição da Associação de Arqueologia Industrial da Região de Lisboa (AAIRL) e, desde essa altura, uma das principais preocupações foi a necessidade de salvaguarda do património industrial móvel e imóvel suporte da história industrial portuguesa com fins museológicos.
As reflexões no seio do movimento museológico internacional levaram museólogos e outros profissionais ligados à museologia a alargar o conceito de «museu», a conceber e criar espaços museográficos, abordando novas temáticas, quase sempre ligadas à evolução rápida das sociedades contemporâneas. Deste modo, organizaram-se museus de identidade associados a um território ou a uma empresa, a partir da  recolha, estudo e valorização do património museológico.
A exposição “Arqueologia Industrial: Um Mundo a Descobrir, um Mundo a Defender” que se realizou na Central Tejo, em Lisboa, de Maio a Dezembro de 1985 constituiu um acontecimento que potenciou a evolução desta nova disciplina, pois foi um êxito, tanto a nível nacional como internacional, sobretudo entre os especialistas da arqueologia industrial, escolas, empresas e trabalhadores.
Por detrás desta exposição estava a musealização do edifício da Central Tejo, no qual a EDP pretendia a instalação do Museu da Electricidade, uma iniciativa com bastante sucesso. Estas iniciativas tinham como perspetiva, a conjunção de esforços, por parte do Instituto Português do Património Cultural (IPPC) e da EDP na fundação do Museu da Indústria, no entanto, após o encerramento da exposição por falta de reconhecimento dos órgãos do estado, adiou-se a criação deste museu.
Na sequência desta exposição realizou-se, em 1986, o I Encontro Nacional de Património Industrial. Neste encontro defendeu-se a necessidade de apoio oficial à Arqueologia Industrial nas suas várias vertentes.
No seguimento deste encontro a Associação de Arqueologia Industrial da Região de Lisboa procedeu a uma revisão dos seus estatutos e transformou-se, em 1987, na Associação Portuguesa de Arqueologia Industrial (APAI).
Nos anos seguintes surgiram museus de temática técnica e arqueológico industrial, ligados a empresas, autarquias e outras instituições, nos quais a Associação de Arqueologia Industrial teve um papel preponderante, são exemplos o Museu da Água (EPAL), Museu da Electricidade (EDP), Museu do Ferro da Região de Moncorvo, os núcleos de construção naval e do moinho de maré de Corroios do Ecomuseu do Seixal, Museu dos Lanifícios da Covilhã, Museu da Indústria Vidreira, Museu do Cimento da
CIMPOR, Museu do Papel de Paços Brandão, Museu Têxtil de Famalicão, entre outros.
Apesar de algumas iniciativas como estas, muito do nosso património industrial é deixado ao abandono ou então destruído por interesses imobiliários. É necessário o desenvolvimento de uma maior consciencialização sobre a preservação do património industrial na qual a acção das autarquias deve ter um importante papel.
As ferramentas e o trabalho formam parte da nossa cultura no sentido mais literal da palavra, o património industrial, como um organismo vivo, está constituído de maneira indissociável do seu passado, presente e do seu futuro. Partindo desta base é importante preservar e salvaguardar este património, sendo que através da sua musealização é possível incorporá-lo num local de intercâmbio e comunicação que nos permite redescobrir o nosso passado industrial, assimilar a cultura técnica e procurar testemunhos de uma melhor compreensão da nossa sociedade.
A arqueologia industrial não tem recebido proteção oficial, o desenvolvimento dos estudos que se relacionam com o património industrial são mais iniciativas particulares e do enquadramento associativo dos seus especialistas do que do resultado de projetos de interesse nacional tutelados pelas instituições estatais ou regionais, apesar de as populações estarem cada vez mais sensibilizadas para a valorização do seu
património industrial.
É uma preocupação a preservação e valorização dos bens industriais, tangíveis e intangíveis, assim como o acesso de todos à cultura técnica e científica, deste modo é muito importante a participação da comunidade no esforço de proteção e valorização deste património que materializa a sua memória e ilustra a sua identidade. 
Tal como qualquer outro tipo de património, os bens industriais valorizados podem e devem ser preservados e conservados. As tendências modernas passam pela prioridade ao inventário sistemático dos bens, actualmente ameaçados por razões de especulação imobiliária, viabilizar uma política de potenciação dos recursos culturais ao mesmo tempo que se identifica as principais realizações técnicas, industriais e
emocionais do património fabril e mineiro.
As pequenas intervenções de carácter museológico revelam-se inovadoras, porque permitiram salvaguardar e valorizar recursos locais, naturais e culturais, promovendo o saber fazer tradicional, ao mesmo tempo que deram um novo uso a esses bens. Enfim, o património industrial reaproximou-se das gentes locais, porque embora nalguns casos estivesse perto de quem fabricou e utilizou, tinha perdido a sua função inicial, tornando-se por isso um peso morto ou, quase morto, difícil de conservar ou animar.


Museu da Electricidade (Lisboa)

terça-feira, 3 de março de 2015

Museus | Estudos de públicos

 Os estudos de públicos (e não-públicos), são uma das temáticas centrais na museologia atual. 
 Nos últimos anos os museus para proteger a sua missão e a sua independência têm-se deparado com pressões crescentes para que adotem uma maior orientação para os visitantes, tenham mais em conta os interesses e necessidades dos públicos e respondam à procura do mercado em geral.
 Atrair, agradar e manter o público são objetivos fundamentais de qualquer museu. É necessário conquistar as pessoas, fazendo com que este fique visível, familiar e atraente, mas também é necessário persuadi-las para que repitam a visita com ofertas motivadoras e experiências satisfatórias que predispõem às pessoas converter-se em visitantes regulares. Não é apenas fundamental proporcionar uma boa experiência aos visitantes como, também, ir melhorando as técnicas de marketing com a finalidade de atrair públicos. 
 Atualmente, com a tomada de consciência da sua importância cultural e pedagógica os museus pretendem chegar a um público cada vez mais alargado e diversificado assumindo, por vezes, um forte papel social. Os museus que, outrora, davam total prioridade às suas coleções ou à sua investigação estão a colocar, agora, os visitantes no centro das suas atividades ao estabelecer relações com as suas comunidades, disponibilizar recursos para atrair públicos mais numerosos e diversos e aplicar novos conceitos e métodos para contribuir para que as ofertas dos museus sejam satisfatórias e educativas para os visitantes.
 Antes da definição de qualquer estratégia de marketing é essencial, o museu identificar e definir os seus públicos. Para tal é de extrema utilidade realizar estudos de públicos e avaliações de exposição. 
 Há que ter em conta que os museus servem públicos diversos: vários grupos sociais, diferentes faixas etárias e visitantes que tem interesses, intenções e expectativas díspares. Incluem pessoas que simplesmente passam e entram por curiosidade e outras que planeiam a sua visita. Existe toda uma variedade de factores culturais, sociais e de personalidade que influenciam o nível de conhecimento, disposição e interesse pelos museus.
 Para compreender os públicos de um museu também é importante os responsáveis averiguarem porque é que certas pessoas nunca chegaram a visitar (os não-públicos), porque é que outros visitam de forma ocasional e por que é que outras visitam com regularidade.
 Mas afinal o que são ou em que consistem os estudos de público?
Existem várias definições mas veremos a da American Association of Museum através do seu Committee on Audience Research and Evaluation:

(…) estudos de visitantes, um termo geralmente usado na área da museologia para descrever o processo de obtenção de conhecimentos sistemáticos sobre os visitantes dos museus, atuais e potenciais, com o propósito de incrementar e utilizar esse conhecimento na planificação e execução das atividades relacionadas com os públicos."

 Os estudos de públicos possibilitam aos museus não só a identificação dos seus públicos e dos seus não-públicos como também permitem fazer uma avaliação do cumprimento dos objetivos a que o museu se propõe, permitindo desta forma identificar potenciais melhorias na programação museológica: reabilitação do espaço, implementação de novas estratégias de comunicação e marketing, elaboração de novas propostas de oferta educativa, reprogramação expositiva, etc.
 No que toca à metodologia utilizada, os estudos de públicos utilizam técnicas de recolha de dados procedentes de diversas áreas (psicologia, sociologia, educação, ciências da comunicação, linguística, arquitetura, entre outras). As técnicas a utilizar devem ser escolhidas tendo em conta a informação que o museu pretende obter e os recursos humanos, económicos, temporais e físicos que tem ao seu dispor. 
 Para uma maior validade e rigor da informação dos estudos de públicos devem ser aplicadas diversas técnicas, assim como estes devem ser realizados com certa periodicidade. É muito importante a constituição de equipas de trabalho multidisciplinares que trabalhem em consonância com os profissionais do museu envolvidos nos serviços relacionados com os públicos.
 Em Portugal, são escassos os estudos realizados neste âmbito, muito devido à apreensão da realização deste tipo de avaliações dentro das instituições e à falta de recursos para efetuar estudos desta dimensão.
 Os estudos de públicos como fonte de conhecimento que ajudam a reelaborar os projetos do museu com vista à melhoria da relação entre os visitantes e a exposição tornam-se imprescindíveis, nos dias de hoje os museus vivem de pessoas e não apenas de objetos...


segunda-feira, 2 de março de 2015

Património | Bragança


Vista sobre o castelo de Bragança
Convido-vos a uma visita ao Castelo de Bragança e respectiva vila muralhada, a freguesia de Santa Maria...


A construção deste castelo teve início em 1409 sendo terminado 30 anos depois. É constituído por um conjunto extenso de muralhas e possui 15 torres ou cubelos, da quais se destacam a "Torre da Princesa" e a"Torre de Menagem" que ostenta na fachada sul a pedra de armas da casa de Avis e uma graciosa janela ogival geminada. Conta a lenda que a "Torre da Princesa" tem este nome por ter sido a prisão de uma princesa que esperava pelo seu amado trovador. No Castelo existem 3 portas (duas Portas de Santo António e uma Porta do Sol) e 2 postigos (a Porta da Traição e o postigo do Poço do Rei). No interior da Torre de Menagem está instalado o Museu Militar. Este possui várias salas, às quais é atribuído um nome. Através das salas que vão sendo desvendadas à medida que subimos a escadaria de granito que serve de couraça à própria torre, fazemos uma viagem ao nosso passado histórico-militar, desde a Reconquista e fundação de Portugal até à I Guerra Mundial.
Torre de Menagem

No interior da cidadela, de planta ovalada, ainda temos o pelourinho medieval, bastante singular porque assenta sobre uma figura zoomórfica, conhecida como "porca da vila", certamente anterior ao pelourinho e estranha às funções deste. O pelourinho data do séc. XIII, o capitel é uma cruz de braços iguais e nele estão representados uma ave, um cão, um homem e motivos fitomórficos, em cima da cruz está um escudo com um castelo e quinas que é segurado por uma figura humana.

Pelourinho


No centro da vila fica o seu principal aglomerado, que tem no seu topo a Igreja de Santa Maria, também designada de Nossa Senhora do Sardão. Ao lado desta encontra-se o Domus Municipalis, um edifício único na Península Ibérica dentro da arquitectura civil românica e o ex-líbris da cidade. A sua construção data, muito provavelmente, do primeiro terço de quatrocentos. A Domus Municipalis engloba duas funções, a de cisterna de águas pluviais e nascentes, e a de sala de reuniões dos "homens-bons" (conselho municipal).
Igreja de Santa Maria
Domus Municipalis











No interior da vila ainda existe o Museu Ibérico da Máscara e do Traje, ao qual também aconselho a visita, no qual estão os trajes e máscaras usados nas festas de Inverno de Trás-os-Montes e da província de Zamora (Espanha), tem os tradicionais fatos das "Festas dos Rapazes", das festas dos Reis e do Carnaval.



Fotos: Ana Filipa Simões